Nos últimos meses, o mercado brasileiro de livros escreveu alguns de seus mais dramáticos e decisivos capítulos. Em março, a rede Laselva teve sua falência decretada pela Justiça, com mais de R$ 100 milhões em dívidas. Num enredo semelhante, a francesa Fnac fechou sua última unidade no país, na capital paulista, e zarpou desse mercado em setembro. Enquanto isso, as duas maiores livrarias brasileiras, a Cultura e a Saraiva, anunciavam fechamento de dezenas de unidades e renegociação de dívidas com fornecedores.
“Não tinha como ser diferente em um ambiente de total ausência de incentivos e com uma pressão de custos insuportável”, diz Bernardo Gurbanov, presidente da Associação Nacional das Livrarias (ANL). “O mercado de livros terá de se reinventar, com menos lojas e espaços menores, mas precisará também ter uma política fiscal mais apropriada aos novos tempos.”
Nem tudo, no entanto, aponta para um final infeliz para o mercado editorial. A rede mineira de livrarias Leitura está em negociações para a compra de cinco lojas que antes pertenciam à Saraiva, principalmente no mercado paulista. Se a proposta — que não teve o valor relevado — for aceita, a Leitura vai alcançar 75 unidades no ano que vem, se consolidando na vice-colocação no ranking do setor, atrás apenas da própria Saraiva, dona de 84 endereços.
Segundo o presidente da Leitura, Marcus Teles, a ideia é mudar a bandeira da Saraiva para a Leitura e fortalecer a rede em um mercado ainda pouco explorado por ele. Por outro lado, a Saraiva reconhece que, para crescer, terá de encolher. “Em linha com sua estratégia, as iniciativas refletem um esforço da companhia em obter rentabilidade e ganho de eficiência operacional, dentro de uma estrutura mais enxuta e dinâmica. Nesse sentido, as medidas adotadas pela companhia incluem o fechamento de algumas lojas. Com este movimento, a empresa dá continuidade ao seu plano de transformação, que inclui aberturas, reformas e fechamentos de unidades, a fim de manter sua operação saudável e cada vez mais multicanal”, informou a Saraiva, em nota.
O problema é que o possível negócio entre a Leitura e a Saraiva é apenas uma boa notícia em um mar de problemas. Nos últimos 12 anos, segundo a ANL, o mercado editorial despencou 21%, o equivalente a R$ 1,4 bilhão de queda em receita. Diante da sangria, as associações e empresas do setor se uniram para reivindicar um socorro governamental. Junto com a ANL, a Câmara Brasileira do Livro (CBL) levou ao governo federal um estudo sobre o drama que vive o setor.
Até agora, segundo as entidades, o ministro Eliseu Padilha (Casa Civil) não retornou. A pauta basicamente rascunha o conteúdo de uma medida provisória que cria uma Política Nacional de Regulação do Comércio de Livros. O presidente da CBL, Luís Antonio Torelli, acredita que o aval do Planalto daria fôlego para que o setor volte a respirar. “É mais do que urgente combater a perversa guerra de preços”, diz Torelli. “Os leitores perderam a noção de quanto devem pagar na hora da compra. Há critérios desproporcionais entre as concorrentes. As lojas cobram o que bem entendem. Adotam descontos prejudiciais. Não há como resistir a essa prática.”
Os argumentos de Torelli estão detalhados no documento entregue ao Planalto. Pelo menos de imediato, é o que o presidente da CBL vê como esperança para tirar o setor editorial de uma crise que ele considera monstruosa. “Infelizmente, não vejo de outra forma. Temos pressa”, desabafa. Além da CBL e da ANL, participam do movimento o Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL), a Liga Brasileira de Editores de Livros (Libre) e a Associação Brasileira de Editoras Universitárias (ABEN).
Uma reação minúscula no primeiro semestre de 2018 é um tímido sinal de esperança: o faturamento do mercado editorial como um todo registrou alta de 9%, e de 5,24% no volume de vendas. O Panorama Cultural do Instituto Brasileiro de Geografia (IBGE) aponta que, em 2004, pelo menos 42% dos municípios mantinham livrarias. Atualmente, não passam de 27%. Em 2013, havia 3.095 livrarias no país. Agora, somente 2.500. Segundo a Unesco, o ideal seriam 20 mil — uma para cada 10 mil habitantes.
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