Como nascem amizades estimuladas pela Poesia.
Lembro ainda nesta derradeira quadra da vida como, através de poetas, conhecidos ou não, cheguei a conhecer entusiastas de suas obras em lugares os mais distantes. Assim foi com o falecido a sempre lembrado amigo Domènec Bejiga i Corzo, um dos mais brilhantes tradutores que tenho conhecido, a quem cheguei pela nossa admiração pela obra dos poetas que marcaram o Renascimento da Literatura e da Língua Catalãs, os chamados restauradores das letras catalãs modernas. Este é apenas um dos exemplos de que poesia e tradução podem realizar em favor da aproximação entre estudiosos de bons poetas, muitas vezes escondidos nos seus pequenos territórios ou perdidos nas covas do passado e quase esquecidos. Lembro como cheguei a conhecer e apreciar a poesia de Jacint Verdaguer, Joan Maragall, Carles Ribas e outros luminares, como então metaforicamente se dizia dos grandes nomes das letras, fossem muito importantes para a história das suas literaturas, ou não. Essas aproximações entre críticos e investigadores trazem, na maioria dos casos, bons resultados.
Há casos em que estudiosos de pequenas localidades, quem sabe para aligeirarem os seus ócios, ou espanarem o pó de sobre túmulos de nomes locais que tiveram algum destaque, se lançam a investigar vida e obra desses mortos queridos e ao fim às vezes de uma vida, terminam por descobrirem poetas e prosadores que, por um motivo ou outro, não tiveram a ventura de ser estudados e tornados mais conhecidos. Outras vezes, a sensibilidade e generosidade de bons estudiosos levam-nos a descobertas que, sem exagero, poderíamos mesmo chamar de proveitosas. E costumo citar o nome de Silveira Bueno, que chegou a professor emérito da Universidade de São Paulo, autor de vasta obra sobre as nossas letras e as portuguesas e a quem se devem excelentes antologias das literaturas luso-brasileiras, como ele gostava de escrever, inclusive na sua obra mais conhecida e de maior utilidade didática, a Literatura Luso Brasileira , que teve muitas edições e vem sendo útil a gerações, malgrado algumas imprecisões ou falhas de julgamento crítico sobre autores e livros. Mas a Silveira Bueno pode-se atribuir a “invenção” de poetas e prosadores dos princípios do século XX que, sem o trabalho de descobridor e as suas palavras generosas talvez não tivessem logrado, mais tarde, a fama e o prestígio que vieram a ter, quando passaram a ter um lugar nos anais da literatura brasileira. E cito uns poucos nomes cuja notoriedade post-mortem muito deve ao antologista magnífico das Páginas Literárias e das Páginas Floridas, em sua grande maioria de São Paulo, terra do romancista que se escondia sob o pseudônimo de frei Francisco da Simplicidade: Paulo Gonçalves, notável teatrólogo que nos deixou As mulheres não querem alma e Quando as fogueiras se apagam, que o seu estudioso chama de “um romântico em pleno prosaísmo utilitarista de São Paulo”; Jorge Faleiros, que deixou um livro póstumo, Nirvana, “edição preparada e preparada por Silveira Bueno, seu amigo e companheiro de estudos”, como escreve nas Páginas Floridas , que nascido em Patrocínio do Sapucaí, em 1898, falece com apenas 26 anos; Paulo Cursino de Moura, cujo livro São Paulo de outrora teve palavras consagradoras de Silveira Bueno; Amadeu de Queiroz, cujo romance A Voz da Terra, dos mais belos idílios das nossas letras teve acolhida entusiástica e generosa do antologista; padre Lindolfo Esteves e muitos outros. Mas foram as suas referências e o seu zelo pela vida e obra de Rodrigues de Abreu que me levaram a procurar e ler o que podia do poeta capivariano, que morre com apenas 30 anos e deixa obra que, desde então, vem sendo estudada e discutida, com reedições constantes dos seus versos, com Noturnos, A sala dos passos perdidos, A casa destelhada, a merecerem belas cuidadas edições e o poeta com estudiosos de sua vida e obra que cresceu muito nos últimos anos. Curiosamente, na sua História da Literatura Luso-Brasileira, 6ª. edição, de 1968, atualizada, ele inclui um poema, “Litania das minhas dores”, de tocante singeleza e muita dor quando alude a
Meu desejo feroz de humilhação! Não ter um movimento de bondade, apesar de rezar tanta oração!
poema que se não lê sem funda emoção e cita de passagem o nome do poeta capivariano no capítulo sobre as “Tendências atuais da literatura brasileira”, diferentemente do que até então fizera nas antologias, quando lhe dera mais espaço. Talvez o plano sumamente ambicioso de abarcar duas literaturas muito ricas o levasse a ser mais parco com poetas que ele mesmo inventara nas suas primeiras obras.
De Capivari para o Brasil.
Nascido em 1897, em Capivari, Benedito Luís Rodrigues de Abreu, que passaria às páginas da história literária como Rodrigues de Abreu foi uma dessas descobertas fantásticas a que cheguei levado pelas mãos de Silveira Bueno. Tenho-o dito em outras ocasiões. Repito, como forma de gratidão, o nome de Silveira Bueno com as suas notas a respeito de Rodrigues de Abreu. Li e reli os poemas que encontrei nas antologias do professor e procurei encontrar as suas obras. Mais tarde, encontrei a edição das Poesias Completas , com excelente introdução do poeta e crítico Domingos Carvalho da Silva, um infatigável trabalhador intelectual de São Paulo e pude então apreciar tudo o que até havia com o nome do poeta. Com 60p. de Introdução, Carvalho da Silva não deixou nada esquecido sobre a vida, as origens, as andanças e amores e doença do poeta capivariano, além de acrescentar seis páginas de bibliografia . Não parei aí com as minhas investigações sobre o poeta que morrera tão moço e deixara tão magnífica obra poética.
Lembro de professor de Metodologia Científica no curso de Mestrado de Direito que costumava dizer-nos que uma bibliografia, qualquer bibliografia, é interminável. Quanto mais se busca, mais surgem títulos que nem sequer fazíamos ideia de existirem. E foi assim, procurando aqui e ali, que fui encontrando bons estudiosos da vida e obra de Rodrigues de Abreu. Lembro da emoção com que encontrei Vida, Paixão e Poesia de Rodrigues de Abreu , de Carlos Lopes de Mattos, professor do curso secundário, filósofo, com doutorado em Filosofia por Universidade da Bélgica e figura muito respeitada pelos seus estudos e publicações. É uma obra muito boa na qual o autor tudo investiga à luz das mais sérias teorias da biografia e da crítica, pois o autor, talentosamente, realiza um estudo quase completo da vida e da poesia do poeta, como aliás prometera no seu título ambicioso. O autor foi cuidado na busca de documentos e dados sobre o biografado. Visitou muita gente que o conhecera, entrevistou sua noiva eterna, Aracy Prado, conversou com estudiosos da vida e obra de Abreu, como confessa ao explicar as razões da sua obra, entre elas Homero Dantas e João Campagnoli, também eles “poetas e interessados na vida e obra de Abreu” , descendentes, em todos achando boa acolhida e sempre dispostos a ajudarem o biógrafo, que desabafa, aparentemente nostálgico dos dias de exaustiva investigação: “Quantas noites passamos conversando sobre fatos que o povo guardou, sobre gente que teve contacto com Rodrigues de Abreu” e vai, agradecido, anotando nomes e mais nomes. E não ficou aí: procurou escritores ilustres como Manuel Bandeira, Drummond de Andrade, Domingos Carvalho da Silva, Maria de Lourdes Teixeira para discutir sobre a poesia de biografado, enfim, em um trabalho imenso e cansativo, em diversos lugares, indo ainda várias vezes a Bauru, onde morreu Abreu, e lá visitando “genuflexo, o túmulo que guardou o seu corpo mirrado e tísico” (sic!) , enfim, trabalho seriíssimo e de grande devoção, cujos esforços comovem o leitor. Eis uma obra que acredito jamais poderá ser superada na vasta bibliografia de Rodrigues de Abreu. Livro sem igual, lamentando-se apenas que o biógrafo se descuide das notas bibliográficas e das necessárias notas de rodapé, que em muito ajudariam o leitor que, sem elas, se sente um pouco abandonado e inseguro. Contudo, não podemos deixar de salientar que qualquer biógrafo não poderá prescindir da obra de Lopes de Mattos ao tratar da vida e obra de Rodrigues de Abreu: um roteiro seguro e sério, digno de apreciação pelo mais exigente crítico e biógrafo.
... e surge Guedes de Oliveira na esteira de Rodrigues de Abreu.
Procurando mais livros sobre o poeta da Casa destelhada, recebi de um “sebo” de São Paulo pequena, mas recente lista de livros sobre o poeta, assinados por J.R. Guedes de Oliveira, que, para surpresa minha, era também de Capivari. E foi assim que travei conhecimento com o biógrafo e historiador capivariano José Roberto Guedes de Oliveira, a quem devo um pouco mais do pouco que sei de Rodrigues de Abreu. Adquiri quase tudo o que o historiador havia publicado e, levado pelo entusiasmo de haver encontrado esse vasto material bibliográfico, escrevi-lhe, como admirador do artista magnífico de A Sala dos Passos Perdidos.um dia, para meu contentamento, lá me chega pequeno pacote e nele várias de suas publicações sobre o nosso poeta, além de recortes de jornais e edições comemorativas dos aniversários de nascimento e morte do poeta, recolta de poemas cuidadosamente escolhidos pelo organizador. Pequeninas edições de menos de 60p. quase sempre com o retrato do poeta, quase sempre aquele em que aprece de óculos e usando terno preto, que, acredito, é uma de suas melhores fotos e das mais conhecidas. Um rosto em extremo triste, olhar distante e meditativo, testa alta e cabelos negros, anelados. Pus-me logo a ler todo aquele material e sabendo um pouco mais da sua vida e obra. Salienta-se até com insistência dolorosa, a pobreza, a enfermidade e o fracasso amoroso do poeta, assim como a sua entranhada amizade com o acadêmico Amadeu Amaral. Sabe-se que fez cursos irregulares, não chegou a cursar universidades, mas parecia um leitor voraz, um autodidata determinado. Mesmo Lopes de Mattos, o mais meticuloso dos biógrafos, não dá informação cabal das leituras de Abreu e ele raramente apresenta uma citação. Lembro-me de haver encontrado uma curta citação de Nietzsche, em português, na sua “Canção da minha vida”. Mas alude a personagens históricos ou mitológicos e personagens da Literatura Universal, como Xeerazade que ele grafa um tanto artificialmente, à alemã. A sua temática é monocórdia o seu pequeno mundo de dores e fracassos amorosos com as suas pequenas ramificações: o amor infeliz, os fracassos, a enfermidade que o consome, a tísica, a solidão. Raras vezes ele demonstra alegria e exuberância. Tenho pensado algumas vezes que Rodrigues de Abreu seguia a auto aniquilamento tal como lemos, com bastante pietas, no Fioretti e nas biografias de São Francisco de Assis: para ele o mundo não existe sem o sofrimento. A primeira vez que li alguns dos seus poemas, assustei-me. Jamais lera algo semelhante, nem em Heine, nem Leopardi, nem o romancista nostálgico e dolorido de Immensee, escrevera nunca linhas tão sofridas quando o poeta capivariano. Dir-se-ia que ele se sentia bem em expor as suas feridas da alma, como se apenas ele, e somente ele, tivesse experimentado tantos revezes e tivesse saúde tão delicada quanto ele. Mas, depois de algumas leituras sobre a sua vida em São Paulo, aonde o leva a amizade Amadeu Amaral, que o convida a morar em sua casa e lhe dá tratamento de filho, arranjando-lhe emprego em jornais; ao ver o empenho que tiveram seus amigos em Bauru para lhe organizarem a vida, em pequenos empregos que, solteiro como era, talvez lhe bastassem para viver se não com conforto, mas com dignidade; as atenções que sempre lhe tiveram os conterrâneos, acredito que as lamúrias constantes, os poemas dolorosos expondo as suas feridas morais, apresentando-se sempre como tuberculoso (ou tísico, como então se dizia mais comumente!), enfim, a atenção que todos pareciam dar-lhe, chego a pensar que Rodrigues de Abreu ao apresentar-se pobre e desprotegido, “fazia tipo”, ou seja, apreciava fazer-se passar por desvalido, abandonado, pobre de pedir, como o seu igualmente queixoso Antônio Nobre, o magnifico poeta de Só, por muitos críticos, talvez exageradamente, considerado o mais triste livro de versos da língua. Com toda a certeza esses críticos armadores de frases de efeito não conhecem os versos do nosso Rodrigues de Abreu, nem jamais lhe folhearam A Casa Destelhada ou A Sala dos Passos Perdidos ou os Noturnos... Os chavões e suas frases de efeito quase sempre empanam o brilho da realidade!
Como escrevi, Guedes de Oliveira é da mesma terra do poeta e tomou-se de muita curiosidade acerca da vida e obra de Rodrigues de Abreu, como, muitos anos antes Lopes de Mattos fizera, confessando mesmo que, tendo de escolher uma cidade para preencher a vaga de professor de francês, voltou-se para Capivari, que ele chama de “cidade dos poetas”, em flagrante alusão a Amadeu Amaral e Rodrigues de Abreu, mas pelo que posso inferir da leitura dos estudos de Guedes nos anais da cidade, tem havido ai uma pletora de amantes do verso, alguns até publicando bons folhetos, recolhido ainda em jornais e revistas locais. Tenho a impressão de que há naquela pacata e bonita cidade, que conta entre outras coisas, com a honraria de um dia ter recebido a visita do Imperador Dom Pedro II e de ter ali morado por algum tempo o turbulento autor de A Carne e das Cartas Sertanejas e As Procelárias, casando-se com a moça mais bonita do lugar. A cidadezinha é encantadora, sombreada, com lindos parques e jardins, e muito clara. Ali há uma velha ponte, onde segundo corre a lenda, debaixo da qual o romancista mineiro costumava ir ler e escrever depois de concluir as suas lições nas escolas secundárias onde ensinava... e assustava os seus alunos com o temperamento vulcânico que muitos biógrafos lhe apontam. Quando visitei Capivari tive a felicidade de ter como guia o seu historiador-mor, o escafandrista que tudo conhece da cidade e, paciente e bem informado, ia-me informando: “Aqui morou Júlio Ribeiro”, “Neste velho edifício onde hoje é uma pizzaria foi um colégio e nele ensinou o romancista de O Padre Belchior de Pontes” - e assim por diante: o historiador sabe tudo da sua cidade natal e do seu ídolo literário. A cidade ia criando vida diante de mim e eu como que sentia a presença daquela gente famosa do passado que a competência e a segurança de Guedes de Oliveira me iam desvendando aos poucos. Vi a erma de Rodrigues de Abreu, a pracinha com o seu nome e chegava a imaginar que ele estava ao nosso lado, buliçoso e ao mesmo tempo tristonho a recitar o belíssimo poema que um dia dedicou ao grande Plínio Salgado:
Minha vida é uma casa destelhada por um vento fortíssimo de chuva.
(As goteiras de todas as misérias estão caindo, com lentidão perversa, terra triste do meu coração.)
Este que é, talvez, um dos poemas mais tristes da Literatura Brasileira de princípios do século XX. Capivari respira aquele ar de nostalgia e tristeza que emana da poesia sofrida de Rodrigues de Abreu. Pois bem, José Roberto Guedes de Oliveira nasceu na mesma terra do poeta que é o enlevo de seus estudos e de suas investigações, ele mesmo poeta, além de historiador respeitado, tem publicado bom número de poemas e contribuiu belamente para a antologia Lembrança do Instante e Folhas Revoltas, nas quais envereda, vitoriosamente, pela poesia de cunho social, afastando-se da poesia intimista, na qual parece não acreditar com criação estética, ainda que, paradoxalmente, veja em Rodrigues de Abreu um dos maiores representantes da poesia intimista.
Mais uma excelente antologia de Rodrigues de Abreu.
Recebo de Indaiatuba, enviada pelo organizador, o conhecido historiador capivariano José Roberto Guedes de Oliveira, residente naquela bela e próspera cidade, convizinha de Capivari e Rafard, a sua mais recente publicação, as Poesias de Rodrigues de Abreu. Sonetos e versos livres . Guedes de Oliveira tem a queda para a organização de textos de vária origem e esta recente antologia é prova cabal deste talento. Sei o quão difícil é levar a cabo um empreendimento destes, pois além do bom gosto para a seleção, são requeridas outras qualidades, entre elas a paciência e a teimosia para persistir na tarefa. E o estimado historiador é dessas pessoas de paciência acima do normal, capaz de levar meses a buscar em velhos jornais e revistas sobre o que lhe interessa; de frequentar empoeiradas bibliotecas e arquivos municipais ou lançar-se em buscas pelos nossos magníficos “sebos”, de que São Paulo é, sem favor, o lugar mais indicado. E lembro, então, as alegrias experimentadas quando eu frequentava os “sebos” da praça da Sé, ou ia cascavilhar junto à livraria Gazeau, do velho e rabugento francês Monsieur Gazeau, em buscas de velhos livros franceses, em primeiras e raras edições. Sei das surpresas e alegrias que essas buscas nos trazem...
A antologia é primorosa e o organizador soube escolher o que existe de mais elevado na obra de Rodrigues de Abreu, além de poemas que se não encontram nos livros publicados. Há muitos poemas dedicados, pois o poeta parecia ser em extremo afetivo, não esquecendo os seus melhores amigos e aqueles que o ajudaram nos seus momentos mais aflitivos. Por sinal, dedicar uma página em prosa, um poema, uma linha que seja a alguém, é mais que tudo um gesto de afeto e generosidade também, como se se dissesse: “Olha, não me esqueci de ti!” Pude ver nos franceses e nos americanos uma certa predileção pela dedicação de textos em prosa e autores franceses de renome, como o polímata Camille Mauclair, chega a dedicar um dos mais belos livros de ensaios críticos das primeiras décadas do século passado, Princes de l’esprit ao seu “cher ami le dr. Maurice Boigney”, como lá ficou para sempre gravado: o dr. Boigney entrou para a celebridade pelas mãos generosas e bondosas do plasmador de La Religion de la musique. E merecer tamanha dedicatória de um Camille Mauclair equivale a subir um degrau na escadaria da celebridade! Rodrigues de Abreu dedicava amiúde seus poemas a amigos e conhecidos como Menotti del Picchia, Plínio Salgado, Epiteto Fontes, Walter Barioni, Homero Silveira, José Fernandes, Breno Pinheiro, Mario de Andrade, Jorge de castro, Batista Pereira, Paulo Ferraz, e muitos outros, entre conhecidos e desconhecidos, que o tempo terminou por sepultar completamente e que apenas se fazem visíveis os seus nomes nas dedicatórias generosas do poeta... E o poeta ia mais longe no seu desprendimento: chegava fazer dedicatórias a órgãos da imprensa local, como “O Município”, que talvez nem exista mais, a não ser na dedicatória de um soneto.
A seleção está boa e mostra ao leitor e estudioso da vida e obra do poeta no que ele produziu de melhor e na excelente qualidade de seus sonetos, sobretudo os da Poesias avulsas, que Guedes de Oliveira tão belamente escolheu, assim as páginas mais tocantes de A Casa destelhada e A Sala dos passos perdidos. Não perguntei ao esforçado antologista quanto tempo levou para separar tantos poemas belíssimos de Rodrigues de Abreu, nem a metodologia empregada. Se se me permite pequena ressalva diria que lamento a ausência de notas: a. sobre as pessoas que mereceram dedicatórias de poemas; b. a data em que foram produzidos; c. de onde foram recolhidas as peças, que muito enriquecem a obra completa de Rodrigues de Abreu e que, salvo engano, não se encontram na seleção bem cuidada de Domingos Carvalho da Silva, de 1952; d. indicação da procedência das ilustrações que enriquecem a obra de paciência e devoção de Guedes de Oliveira. São apenas leves observações com vistas ao aprimoramento bibliográfico que em nada diminuem, porém, o trabalho digno de elogios do maior conhecedor da vida e obra do infausto poeta morto tão moço ainda.
Com Poesias de Rodrigues de Abreu. Sonetos e versos livres, Guedes de Oliveira coloca mais um tijolo no monumento ao poeta e, por sua vez, sagra-se como o seu mais abalizado e probo estudioso. Iria mais longe - e não hesitaria em dizer que é quase impossível estudar-se a vida e obra de Rodrigues de Abreu sem valer-se do que lhe vem dedicando através dos anos Guedes de Oliveira.
Florianópolis, 07/08 de ago. de 2023.