Palavras de Fábio Lucas na sessão de homenagem a Décio de Almeida Prado

Palavras de Fábio Lucas na sessão de homenagem a Décio de Almeida Prado, realizada na Biblioteca Mário de Andrade a 18 de novembro de 1994.

Em nome da União Brasileira de Escritores, desejo enumerar alguns dos motivos que nos levaram a propor esta homenagem a Décio de Almeida Prado.

Vale recordar que, em março deste ano, foi eleita nova Diretoria da entidade. Mal iniciamos as primeiras reuniões, a fim de estabelecer as diferentes metas políticas e culturais a serem alcançadas durante a gestão que se iniciava, fomos surpreendidos, a 6 de maio, com um despejo que acabou por abalar o patrimônio cultural representado por cinqüenta anos de organização e atividade dos escritores, já que a UBE incorporou a história da Associação Brasileira de Escritores e da Associação Paulista de Escritores.

Na situação em que ora nos encontramos, de quase generalizado desapreço pela função social do escritor, quer do ponto de vista do poder público, quer em relação à maioria das instituições privadas, sentimos cintilar entre nós uma chama de auto-estima, pois, afinal, somos a maior representação de autores do Brasil, com cerca de três mil filiados em todo o país. Portanto, três mil escritores que confiam na entidade. Daí nasceu a primeira razão de homenagear Décio de Almeida Prado, pois ele havia publicado recentemente duas obras de capital importância para a história e para a crítica teatral: Teatro de Anchieta a Alencar (São Paulo, Perspectiva, 1992) e Peças, Pessoas, Personagens: o Teatro de Brasileiro de Procópio Ferreira a Cacilda Becker (São Paulo, Companhia das Letras, 1993).

É que Décio de Almeida Prado pertenceu ao Conselho Fiscal da primeira Diretoria da UBE, presidida por Sérgio Milliet, em 1958. Tornou-se, portanto, um dos fundadores de nossa entidade. Nada mais oportuno, então, que restabelecer nosso vínculo com as origens da UBE, a fim de realçar o espírito de continuidade da luta dos associados em prol da solidariedade humana, dos direitos do escritor e da liberdade de expressão.

Outro mérito distingue Décio de Almeida Prado: o de ter dirigido, desde a criação, o “Suplemento Literário” de O Estado de S. Paulo, por um período que foi de 1956 a 1966. Na verdade, um decênio de marcante atividade na divulgação de obras e de autores, ou seja, na circulação do saber literário. O “Suplemento Literário”, idealizado por Antonio Candido, teve em Décio de Almeida Prado o seu perfeito realizador. A tal ponto que o órgão literário se tornou um dos mais expressivos da vida cultural brasileira, pela abertura a todas as correntes de opinião, pelo sentido de universalidade, pelo prestígio e respeito conferidos ao escritor, sem distinções regionais, clubísticas ou ideológicas.

Hoje, quando a indústria cultural tende a tornar a informação sobre a literatura um ramo do jornalismo, é de nosso dever, como escritores, prestigiar quem soube fazer do jornalismo um veículo da cultura literária. Na verdade, o suplemento dirigido por Décio de Almeida Prado se tornou o principal instrumento para a discussão e o debate das tendências artísticas vigentes no Brasil.

Antonio Candido, em depoimento anexo à tese de Marilene Weinhardt, O Suplemento Literário d' O Estado de São Paulo 1956-1967 (Brasília, INL, 1987, vol. II, p. 451) pronuncia-se deste modo: “Eu acho que o Suplemento Literário d' O Estado de S. Paulo foi uma empresa cultural muito importante, não porque foi planejada por mim, nem porque foi fundada pelo Estado de S. Paulo, mas porque foi dirigida pelo Décio de Almeida Prado”.

Por último, a personalidade de Décio de Almeida Prado merece destaque pela contribuição ao estudo do teatro brasileiro. Quer como crítico, que como historiador, orientou gerações na avaliação de nosso universo teatral. Fundamentalmente foi um mestre. De certo modo é responsável pela introdução da disciplina Literatura Dramática no estudo da literatura brasileira na Universidade de São Paulo. Com tudo isso, conforme bem acentua Antônio Arnoni Prado, em artigo publicado em Novos Estudos (nº 38), o nosso homenageado realizou a conexão que faltava entre o estudo da literatura e a análise do teatro, principalmente a relação entre a renovação do teatro e o modernismo.

Assim sendo, a Diretoria da União Brasileira de Escritores, tendo em vista os motivos acima, resolveu imprimir numa placa o conteúdo desta homenagem, fundindo num suporte menos vulnerável à ação do tempo o carinho e a admiração que a entidade tributa ao grande intelectual brasileiro Décio de Almeida Prado.


Em 18 de novembro de 1994, a União Brasileira de Escritores, com o apoio da Associação Paulista de Autores Teatrais (APART) e do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Estado de São Paulo (SATED/SP) realizou uma sessão de homenagem a Décio de Almeida Prado, na Biblioteca Mário de Andrade, em São Paulo, em que foram proferidos sete discursos, incluindo as lúcidas palavras do homenageado. Diversas personalidades do meio cultural e artístico compareceram ao evento. 

A fim de deixar registrado tão importante momento e levá-lo ao conhecimento de um público maior, a Scortecci Editora decidiu reunir em livro todos os depoimentos, complementando, assim, a merecida homenagem a Décio de Almeida Prado.

João Scortecci