Autores e editores criticam governo por fixar temas em edital de livros

Folha de São Paulo - Bruno Molinero - 11/05/2018 |

Tinha tudo para ser uma boa notícia. Após suspender as compras de livros infantojuvenis no fim do mandato de Dilma Rousseff e abandonar o PNBE (Programa Nacional Biblioteca da Escola), o governo federal lançou neste ano edital para adquirir obras de literatura para os colégios.

Ao ler o regulamento do novo PNLD Literário (Programa Nacional do Livro Didático), porém, autores, ilustradores, editores e profissionais ligados ao livro para crianças suspenderam a comemoração.

“A mudança do nome do programa já indica, por si só, uma transformação na política relacionada à formação de leitores na escola”, afirma a pedagoga Sandra Medrano, coordenadora da Comunidade Educativa Cedac e da revista Emília, especializada em literatura infantojuvenil.

São três as principais reclamações do grupo.

1. As histórias devem ser direcionadas a faixas etárias específicas e seguir eixos temáticos predefinidos.

Com isso, livros precisam abordar temas como a descoberta de si, a relação com a família ou as inquietações da juventude, por exemplo. Outros assuntos podem ser tratados, desde que sejam devidamente nomeados e justificados.

Para Sandra, literatura não é produzida dessa maneira. “Isso fica a cargo dos didáticos e dos paradidáticos. A literatura de qualidade está aberta para reflexões e interpretações.”

2. Com exceção das obras para a educação infantil, os títulos precisam ter tamanhos e tipos de papel específicos. São três formatos: 205 mm x 275 mm; 270 mm x 270 mm; 135 mm x 205 mm. Os que fogem dessas especificações terão que ser adaptados.

“A forma é uma das principais bases de criação e tem conexão direta com a narrativa. Restringir a três formatos significa engessar o pensamento. Em relação ao papel, tenho mais um temor. A baixa gramatura pode ser um limitador de criação visual”, afirma a escritora e designer Raquel Matsushita.

A convite da Folha, os autores e ilustradores Fernando Vilela e Renato Moriconi adaptaram dois de seus livros premiados (“Lampião e Lancelote” e “Bárbaro”, respectivamente) aos tamanhos do edital e avaliaram se há perdas na narrativa. O resultado pode ser visto abaixo.

3. Editoras menores temem sair em desvantagem.

De acordo com Marcelo Del’Anhol, um dos principais problemas é o curto prazo. “Tivemos pouco mais de cinco semanas para a inscrição. Grandes editoras têm equipe maior e menos dificuldades para cumprir as exigências”, diz ele, que é editor da Olho de Vidro, criada em 2017 e com dois livros em catálogo.

Com pré-inscrição aberta até sexta (11) e inscrições até o dia 25 de maio, o edital define que as escolhas serão feitas por comissões técnicas e educadores. Mas não diz quanto será gasto nem quantos exemplares serão adquiridos, o que vai depender de negociações futuras de preço.

Os valores totais, contudo, não devem superar o previsto para o PNLD no ano passado: R$ 1,7 bilhão.

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