'Homem da mala azul' leva livros a comunidades afastadas há 37 anos

Folha de São Paulo - Marilice Daronco - 18/05/2017 |

Resumo Em uma mala azul de madeira, decorada com adesivos de países pelos quais já passou, o promotor de leitura Maurício Leite, 63, guarda o seus maiores tesouros: livros. Nascido no Pantanal, ganhou o mundo por meio de seu projeto Malas da Leitura, que levou livros a todos os países de língua portuguesa e abre os olhos de crianças de aldeias indígenas, assentamentos e locais longínquos para o universo da leitura.

Nasci no Pantanal, em Mato Grosso. Meu irmão já ia na escola, e eu ainda não tinha idade para isso mas, mesmo assim, ia com ele. Parece poético, mas era rodeado de jacarés, garças e tuiuiús que tentavam atacar a gente.

Minha infância foi cercada de livros, de discos, de gente doida que viaja de uma hora para outra. Quando eu tinha 6 anos, já tinha vivido numas 15 cidades.

A leitura me criou muitos desejos. Eu lia muito sobre a África, a Índia, sobre o cinema de Nova York. Tinha uma vontade imensa de conhecer esses lugares, e depois morei em todos eles.

Iniciei meu trabalho com aldeias indígenas em Mato Grosso. Depois fui para o Rio de Janeiro, cursei arte e educação, e quando voltei me enfiei na floresta amazônica e lá fiquei muito tempo.

Trabalhei pelo país afora, em núcleos do sertão, na zona rural. As escolas eram precárias, telhado de palha, pegavam fogo, não sobreviviam a uma estação. Então, eu levava meus livros e os professores copiavam as ilustrações com carbono.

Teve uma professora que tinha apenas duas saias. E uma dela tinha desenhos, então ela pegou essa saia, cortou os quadradinhos das ilustrações e fez 16 livros. Eu disse para ela: "Mas agora você ficou com uma saia só", e ela me respondeu que sim, mas que agora ela tinha 16 livros.

Comecei a pensar que tinha de arranjar um jeito de os livros poderem viajar. Como uma quantidade menor de livros atinge uma quantidade maior de pessoas? Montei a primeira mala de leitura.

Em 1980, montei as primeiras 270 malas, com recursos da Unicef. Não sabia que aquilo ia me dar o mundo: fui fazer malas no Arizona, Novo México e Montana [nos EUA], trabalhei em Angola para o Itamarati e desde 2008 sou indicado pelo governo de Angola ao prêmio Astrid Lindgren Memorial (Alma), que reconhece o esforço em promover a leitura para crianças.

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